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COVID-19 é mais mortal para negros brasileiros [...]

[...] um legado de racismo estrutural que remonta aos tempos de escravidão.

 

Veículo: Theconversation.com

Data de publicação: 11/06/2020

Autorx: Kia Lilly Caldwell e Edna Maria de Araújo

Título original: COVID-19 is deadlier for black Brazilians, a legacy of structural racism that dates back to slavery

Traduzido por/Translated by: Hannah Hebron

Este artigo foi indicado para tradução pela leitora Juliana Poncioni Mota

 

Os Estados Unidos e o Brasil têm muito em comum quando se trata do coronavírus.


Ambos estão entre os países mais atingidos do mundo, onde centenas morrem diariamente. Seus presidentes de mesma opinião, Donald Trump e Jair Bolsonaro, foram amplamente criticados por terem lidado mal com a pandemia.


E em ambos os países o vírus está afetando desproporcionalmente os negros, resultado do racismo estrutural que remonta à escravidão.


O legado da escravidão


O Brasil trouxe à força cerca de 4 milhões de africanos escravizados para o país ao longo de três séculos, mais do que em qualquer outro lugar nas Américas. Cerca de metade da população de 209 milhões são negras - a segunda maior população de afrodescendentes do mundo, depois da Nigéria.


O Brasil moderno nunca havia legalizado a discriminação racial como Jim Crow, mas as desigualdades raciais estão profundamente arraigadas. Apesar de um mito persistente do Brasil como uma “democracia racial” integrada, a discriminação no emprego e a segregação residencial limitam as oportunidades para os negros.


Esses e outros fatores se traduzem em expectativa de vida, educação e padrões de vida inferiores para os afro-brasileiros. Os brasileiros negros vivem, em média, 73 anos - três anos a menos que os brasileiros brancos, de acordo com a Pesquisa Nacional de Domicílios de 2017. Os EUA têm uma diferença de expectativa de vida quase idêntica entre populações brancas e comunidades racializadas.


Como os dados do governo no Brasil não são coletados automaticamente por raça ou etnia, os impactos do racismo na saúde podem ser difíceis de medir. O governo Bolsonaro não exigiu a coleta de dados raciais do COVID-19 até o final de abril, bem no meio da pandemia, após muita pressão. [O governo] Ainda não divulgou essa informação.


Independentemente disso, em abril o Ministério da Saúde já havia apontado altas taxas de mortalidade por COVID-19 entre os afro-brasileiros, uma categoria que inclui pessoas que se identificam como "negras" ou "pardas" no censo. As autoridades de São Paulo também anunciaram que as taxas de mortalidade entre os pacientes com COVID-19 eram maiores entre os negros.


Agora, dados coletados em maio por pesquisadores externos em mais de 5.500 municípios, mostram que 55% dos pacientes afro-brasileiros hospitalizados com COVID-19 grave morreram, em comparação com 34% dos pacientes brancos de COVID-19.


Saúde e racismo


Somos pesquisadores em saúde - um americano, um brasileiro - que há muitos anos estudam como as disparidades raciais no Brasil afetam os negros, observando desde anemia falciforme até saúde reprodutiva.


Nossa pesquisa nos últimos dois meses constata que o racismo estrutural - na forma de condições de trabalho de alto risco, acesso desigual à saúde e piores condições de moradia - é um fator importante que molda a pandemia de COVID-19 no Brasil.


Por mais de uma década, ativistas negros e pesquisadores em saúde pública vêm apontando que o racismo institucional cria piores resultados para a saúde da população negra brasileira. Os brasileiros negros experimentam taxas mais altas de doenças crônicas como diabetes, pressão alta e problemas respiratórios e renais devido à insegurança alimentar, acesso inadequado a medicamentos e prescrições inacessíveis.


O próprio racismo também causa um forte impacto físico sobre os negros. Estudos nos Estados Unidos demonstram que as experiências diárias de racismo e discriminação podem levar a níveis de hormônios do estresse perigosamente altos e diminuir a capacidade do corpo de combater doenças. O viés racial de profissionais médicos também acarreta em resultados ruins para pacientes negros.


Ao contrário dos EUA, o Brasil possui assistência médica gratuita e universal. Mas seus hospitais públicos têm sido lamentavelmente subfinanciados desde uma profunda recessão que começou em 2015.


Atualmente, os leitos de terapia intensiva são escassos nos hospitais públicos de várias cidades que combatem surtos de coronavírus. Isso é especialmente prejudicial para os pacientes negros do COVID-19, uma vez que os afro-brasileiros dependem mais do sistema de saúde pública do que os brasileiros brancos, que geralmente têm seguro de saúde privado por meio de seus empregos.


Pobreza e exposição


A desigualdade econômica extrema é outro fator crítico que molda a saúde geral dos afro-brasileiros. Com o top 10% da população concentrando 55% da renda doméstica, o Brasil fica atrás apenas do Catar em concentração de riqueza, de acordo com um relatório de 2019 das Nações Unidas.


Poucos, se é que existem, afro-brasileiros estão entre os super-ricos do Brasil. Dados nacionais de pesquisas domiciliares mostram que brasileiros negros e pardos ganham muito menos dinheiro que brasileiros brancos, mesmo em caso de formação educacional equivalente. A diferença salarial racial no Brasil realmente supera a diferença salarial entre homens e mulheres: as mulheres brancas ganham 74% a mais que os homens negros.


De um modo geral, quanto maior o salário, menor a probabilidade de os afro-brasileiros terem o emprego. Muitos trabalham nos setores informal e de serviços, como faxineiros ou vendedores ambulantes. Outros são trabalhadores independentes ou desempregados.


Durante a pandemia, essa insegurança econômica diminui drasticamente a capacidade dos afro-brasileiros de se distanciarem socialmente e os torna altamente dependentes de permanecer em seus empregos, apesar da ameaça à saúde.


Empregadas domésticas, por exemplo - a maioria delas são mulheres negras - estão se mostrando um grupo de alto risco. Trabalhadores domésticos estavam entre as primeiras mortes de COVID-19 no Brasil.


Riscos nos bairros


O surto de coronavírus no Brasil se originou em bairros ricos cujos moradores haviam viajado para a Europa, mas a doença está se espalhando mais rapidamente em seus bairros urbanos pobres, densos e há muito negligenciados.


Pouco mais de 12 milhões de brasileiros, a maioria negros, vivem em assentamentos urbanos informais, das favelas do Rio de Janeiro às “periferias” de São Paulo. Essas áreas têm acesso inadequado à água e ao saneamento, dificultando o cumprimento das recomendações básicas de higiene, como lavar as mãos com sabão.


Portanto, embora o impacto díspar do COVID-19 nos brasileiros negros não tenha sido inevitável, nossa pesquisa explica por que não é surpreendente.


O racismo que permeia quase todas as facetas da sociedade brasileira aumenta a exposição das pessoas negras ao vírus - e então reduz sua capacidade de obter atendimento de qualidade.

 

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