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Eu não preciso de mensagens de “amor” dos meus amigos brancos

Atualizado: 14 de jul. de 2020

Eu preciso que eles lutem contra o racismo.

 

Veículo: Nytimes.com

Data de publicação: 05/06/2020

Autorx: Chad Sanders

Título original: I Don’t Need ‘Love’ Texts From My White Friends

I need them to fight anti-blackness.

Traduzido por/Translated by: Fernanda Ribeiro

 

Meu livro está para ser lançado em poucas semanas e eu não sei se estarei vivo até lá para ver isso, pois sou um homem negro.

Na tarde de segunda feira, minha agente, uma mulher liberal de mais ou menos 30 anos me enviou um e-mail informando que estava adiando uma reunião importante com o meu editor para o dia seguinte. A agência que representa o meu livro estava observando o “Blackout Tuesday” (dia em que as hasthtags foram lançadas em redes sociais em apoio às mortes por questões raciais ocorridas recentemente nos Estados Unidos) para honrar George Floyd, Ahmaud Arbery, Breonna Taylor e outros incontáveis homens e mulheres negros que foram brutalizados e mortos de forma injustificável.


A empresa decidiu “aproveitar esse tempo para refletir e pensar sobre ações a longo prazo que podemos tomar de forma individual e enquanto organização para enfrentar o racismo sistêmico que persiste em nossos negócios e comunidades”, acrescentou ela.

Para parafrasear, minha agente estava adiando uma importante reunião para a conclusão e lançamento oportuno do meu livro – que trata sobre como negros podem aplicar lições originadas de experiências traumáticas às próprias carreiras – para que os brancos pudessem refletir como ajudar os negros. Eu contra argumentei, insistindo que nosso encontro ocorresse conforme agendado porque a vida dos negros corre perigo e eu não deveria ter que sacrificar o impulso de um livro escrito para os negros porque os brancos estão performando sua empatia.


O comportamento desta agência é comum neste momento. Os brancos estão empurrando a mim e outras pessoas como eu para o lado para aliviar sua própria culpa e provar que eles são diferentes de Derek Chauvin – o policial demitido acusado de assassinar George Floyd em Minneapolis – e Amy Cooper, que tentou armar sua brancura chamando a polícia de Christian Cooper, um observador de pássaros, no Central Park.


Pessoas negras estão sendo pisoteadas no processo. Muitas pessoas brancas que eu conheço estão se derramando em culpa e tentando ser excessivamente zelosas para causar simpatia. Eu os tenho evitado o melhor que posso, tentando viver, apoiar minha família e amigos negros e executar as funções da vida normal como trabalhar, mudar para um novo apartamento e fazer o jantar para a minha namorada.

Porém, descaradamente como sempre, os brancos que têm meu número de telefone estão encontrando uma maneira de drenar meu tempo e energia. Alguns são amigos, outros velhos colegas de trabalho e conhecidos que eu tirei intencionalmente da minha vida em nome da minha paz de espírito. A cada poucos dias eu recebo um monte de textos como este, da semana passada:


“Oi, amigo. Eu só queria te estender a mão e dizer que eu amo e aprecio suas histórias. Eu lamento muito. Este país está profundamente quebrado, doente e racista. Eu sinto muito. Eu acho que estou cansada; enquanto isso, eu durmo no meu aconchegante privilégio branco. Eu te amo e estou aqui para lutar e ser útil de qualquer maneira que eu possa ser. **emojis de coração**

Quase todas as mensagens terminam com essas palavras: Não se sinta obrigado a responder.


Essas pessoas não só estão me usando como um caixote de lixo por causa de sua culpa e vergonha, mas também estão me instruindo sobre o que não sentir, silenciando o meu processo. Em uma admissão invulgarmente honesta de desequilíbrio e poder, o meu “amigo” me informa que eu não tenho que responder. (Nossa, obrigado!). Isto implica que se eu respondo ou não – e normalmente não respondo – a transação está completa, porque a mensagem foi transmitida. O meu “amigo” pode dormir mais descansado em seu aconchegante privilégio branco.


Muitos dos meus amigos negros têm me dito que eles também estão se afogando nessas mensagens cheias de culpa branca.


É possível que essas pessoas brancas que têm meu número não estejam entendendo o que eu preciso agora. Baseado no tom quase lúdico das mensagens que eles estão me enviando, eles parecem pensar que o que eu estou experimentando durante este tempo de matanças e tentativas de matança de negros é algum desconforto vago que um abraço virtual pode aliviar.


Como um homem negro, o que eu sinto na verdade – e constantemente – é medo da morte, o medo que quando eu vou para o meu passeio matinal pelo Central Park, eu não consiga voltar para casa. Temo não poder comemorar os 40 anos de casados dos meus pais; não poderei adicionar dinheiro à conta de poupança do meu sobrinho no seu terceiro aniversário; não poderei levar a minha parceira para dançar nos seus bares favoritos.


Mas o medo não chega apenas ao saber de mortes de pessoas negras como George Floyd, Breonna Taylor e Trayvon Martin. É um zumbido que repousa sob cada momento da minha vida.

Não é como um sentimento de rejeição após o término de uma relação ou a decepção por uma promoção que não veio. O que eu sinto é um medo persistente da morte. Emojis de corações e mensagens positivas não vão me ajudar.


Eu pratico desapego à distração desse medo desde os sete anos de idade, quando vi pela primeira vez as imagens do rosto e do corpo mutilados de Emmet Till na minha aula de estudos sociais do ensino fundamental. Esse desapego me permite fazer coisas muito básicas como sair da cama pela manhã, ganhar a vida e curtir uma música sem sofrer no medo constante.


Quando você me manda uma mensagem dizendo que “você pensou em mim”, porque esse medo está momentaneamente evidente para que você veja as atrocidades retratadas na CNN, você piora as coisas para mim. Você me convida a te mimar, responder e te dizer que a culpa não é sua e você é especial. Isso ataca minha dignidade. Isso me desumaniza.


Quando você diz que eu posso compartilhar meus sentimentos com você, isso é um ato forçado de intimidade e que prova o desapego que eu propositalmente construí ao longo do tempo. Você me força a escavar sentimentos profundamente dolorosos que enterrei para a minha sanidade e para evitar ofendê-lo, pois eu sei que ofender você é perigoso.


Quando você me diz que não preciso responder, você me rouba o último resquício de autonomia que tenho nessa troca indesejada, me dando permissão para fazer o que eu já teria feito.

Então, por favor, para de me enviar mensagens de amor. Pare de me enviar vibrações positivas. Pare de compartilhar seus pensamentos. Ao invés disso, aqui estão três sugestões de coisas que possuem um impacto imediato:


- Dinheiro: Para fundações e organizações que pagam honorários legais para pessoas negras que são injustamente presas, encarceradas ou mortas ou para políticos negros que concorrem a cargos.

- Mensagens: Aos seus familiares e entes queridos dizendo que você não irá visitá-los ou atender telefonemas até que eles tomem medidas significativas para apoiar vidas negras através de protestos ou contribuições financeiras.

- Proteção: Para os companheiros negros que estão protestando e manifestantes que correm maior risco durante as manifestações.

Sim, essas ações podem parecer graves. Mas você insiste em dizer que me ama e amor requer sacrifício. As mensagens de texto são ilimitadas na maioria dos planos das operadoras de telefone. Emojis não são sacrifício.


Se você está sentindo a necessidade de me ver como seu amigo negro, não o faça. Eu vou te dizer o que preciso. Se você não receber uma mensagem minha, essa é a mensagem.

 

Este post é parte do projeto Traduções LIVRES, que faz traduções livres de matérias e artigos produzidos originalmente em inglês por diversos veículos estrangeiros. Não existe nenhuma intenção comercial por trás da disponibilização desse conteúdo, apenas uma vontade de levar informação para quem não domina o idioma. Não possuímos nenhum direito sobre o conteúdo aqui disponibilizado, nem somos autorxs/produtorxs de nenhuma dessas matérias.

This post is part of the project Traduções LIVRES (free translations), that is currently translating materials and articles originally produced in English by several foreign journalists/writers and publish in different vehicles. There is no commercial intention behind making this content available, just a desire to bring information to those who do not speak the language. We are not the authors nor have the rights over the content provided here.

For any inquiries: hannahebron@gmail.com


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