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Novo acordo de paz de Israel transforma o Oriente Médio


 

Link: https://www.newyorker.com/news/our-columnists/israel-peace-deal-united-arab-

emirates-transforms-the-middle-east

Veículo: Newyorker.com

Data de publicação: 14/08/2020

Autorx: Robin Wright

Título Original: Israel’s New Peace Deal Transforms the Middle East

Traduzido por/Translated by: Cintia Tetelbom

 

Em 1982, um combatente pela Palestina me contou uma piada sombria sobre o dia em que a invasão israelense do Líbano forçou seis mil soldados da Organização para a Libertação da Palestina (O.L.P.) a se recuarem em navios para terras distantes. A história começou com Deus dizendo ao presidente Ronald Reagan, o líder soviético Leonid Brezhnev e ao chefe da O.L.P. Yasser Arafat, que responderia a uma pergunta de cada um deles. Reagan foi o primeiro. “Quanto tempo vai demorar até que o capitalismo governe o mundo?” ele perguntou. Deus respondeu: “Cem anos”. Reagan começou a chorar. "Por quê?" Deus disse. “Porque isso não acontecerá durante a minha vida”, respondeu o presidente. Brezhnev então perguntou: "Quanto tempo vai demorar até que o mundo todo seja comunista?" Deus respondeu: “Duzentos anos”. Brezhnev começou a chorar porque isso também não aconteceria em sua vida. Então Arafat perguntou: "Deus, quanto tempo vai demorar até que haja um estado para o meu povo na Palestina?" E Deus chorou.


Na quinta-feira, a Casa Branca anunciou um acordo histórico entre Israel e os Emirados Árabes Unidos (E.A.U.), um xecado rico em petróleo e aliado de longa data dos palestinos, para normalizar as relações diplomáticas. O acordo surpresa - que deve ser assinado em uma cerimônia na Casa Branca nas próximas semanas - incluirá a abertura de embaixadas, intercâmbio comercial e de tecnologia, voos diretos e turismo, e cooperação em energia, segurança e inteligência. Em Tel Aviv, a prefeitura se iluminou com as bandeiras de Israel e dos E.A.U. lado a lado. O presidente israelense, Reuven Rivlin, convidou o príncipe herdeiro de Abu Dhabi, Mohammed bin Zayed, para uma visita.


Muitos dos detalhes ainda estão por vir. No que pode ser uma suposição prematura, a Casa Branca descreveu o acordo como "um grande avanço para os muçulmanos de todo o mundo que desejam vir em paz para orar na mesquita de Al Aqsa", em Jerusalém, porque eles poderão voar diretamente de Abu Dhabi para Tel Aviv e "serem bem-vindos". A ideia de que Israel emitirá um grande número de vistos para muçulmanos de países há muito tempo considerados hostis para orar em uma mesquita no Monte do Templo, o local mais sagrado do Judaísmo, pode ser sonhar alto demais. Em um comunicado a repórteres, Jared Kushner também previu que o acordo enfraquecerá o extremismo jihadista. Novamente, não é provável.


Apelidado de Acordo de Abraão, o acordo é apenas a terceira vez em que Israel ganhou o reconhecimento de um dos vinte e dois estados árabes. O primeiro foi o tratado de paz de 1979 com o Egito. O segundo foi com a Jordânia, em 1994. O novo acordo representa um avanço diplomático para o presidente Trump e o primeiro-ministro israelense Benjamin Netanyahu, pois ambos enfrentam crescentes obstáculos políticos em casa. Nos EUA, conta com apoio bipartidário. Joe Biden, o presumível candidato presidencial democrata, saudou o acordo como "um passo histórico para reduzir as profundas divisões do Oriente Médio". Ele elogiou o E.A.U. por um “ato corajoso e extremamente necessário de governança”.


No entanto, o acordo também destaca como, para os palestinos, um Estado - e uma paz mais ampla - ainda é assustadoramente esquivo, mais de um quarto de século desde de que os Acordos de Oslo delinearam os princípios para a criação de seu próprio país. Depois de décadas de tensões dominantes e marcantes em todo o Oriente Médio, os palestinos não são mais uma prioridade urgente; eles também parecem cada vez mais irrelevantes para as tendências da região. Seus irmãos os estão abandonando. “O conflito é decididamente menos importante para os líderes da região”, disse-me Natan Sachs, diretor do Center for Middle East Policy (Centro por Política no Oriente Médio, em tradução livre) do Instituto Brookings. O acordo é “uma demonstração visível do cansaço de alguns líderes árabes, nos E.A.U. e a Arábia Saudita em particular, com a liderança palestina e sua causa. Eles não querem mais ser retidos pelo que consideram ‘rejeicionismo’ palestino ”.


A principal linha de falha no Oriente Médio também mudou do conflito árabe-israelense para as tensões entre os árabes e o Irã predominantemente persa. À medida que as inimizades mudaram, também mudou a energia diplomática. E, em um exemplo do velho ditado sobre o inimigo de seu inimigo ser seu amigo, os reinados muçulmanos conservadores no Golfo têm cada vez mais encontrado uma causa comum com a liderança judaica em Israel. O acordo pode sinalizar a criação formal de um bloco anti-Irã que vem se construindo discretamente há anos, possivelmente com mais Estados vindo a aderir.


“Este acordo é um passo significativo para a construção de um Oriente Médio mais pacífico, seguro e próspero”, disse Trump a repórteres, após uma ligação a três com Netanyahu e bin Zayed. Ele afirmou que o relacionamento entre os dois líderes durante as negociações secretas, que ocorreram nas últimas seis semanas, "era como o amor". Ele previu: “Agora que o gelo foi quebrado, espero que mais países árabes e muçulmanos sigam o exemplo dos Emirados Árabes Unidos”. Kushner, que supervisionou o plano de paz de Trump no Oriente Médio, disse que algumas outras nações estavam "chateadas por não terem sido as primeiras". Bahrein, outro xecado do Golfo, parabenizou imediatamente os Emirados Árabes por “tomarem medidas para aumentar as chances de paz no Oriente Médio”. Há muito tempo tem existo especulação sobre possíveis laços entre Israel e Marrocos. Em 2018, o ex-sultão de Omã hospedou Netanyahu. O Catar permitiu que Israel abrisse um escritório comercial de curta duração ali na década de 1990, e tem recebido israelenses em conferências desde então, mesmo apoiando financeiramente os palestinos.


Em troca de reconhecimento formal, Netanyahu concordou em “suspender” seu plano - um elemento central em sua proposta de reeleição este ano - de anexar partes da Cisjordânia. Em vez disso, Israel se concentrará em “expandir os laços com outros países do mundo árabe e muçulmano”, disse a Casa Branca. O motivo dos E.A.U. era impedir a anexação e um "golpe fatal" no processo de paz israelense-palestino, de acordo com Anwar Gargash, seu ministro de Estado das Relações Exteriores. “Os Emirados Árabes Unidos estão usando sua seriedade, sua promessa de relacionamento, para tentar realmente desativar uma bomba-relógio que está ameaçando a solução de dois estados”, disse ele. Mas o líder israelense linha-dura disse que não abandonou a anexação. “Estou comprometido com a soberania”, disse Netanyahu, após o anúncio do acordo. Não há “nenhuma mudança” em sua promessa de anexar partes da Cisjordânia. “Eu não desisti dos assentamentos.”


Os palestinos se sentem profundamente traídos. A Autoridade Palestina condenou o acordo Israel-E.A.U. como uma “agressão contra o povo palestino”, retirou o seu embaixador dos Emirados Árabes, e exigiu uma reunião urgente da Liga Árabe. “A liderança afirma que os Emirados Árabes Unidos, ou qualquer outro membro, não têm o direito de falar em nome do povo palestino”, disse em um comunicado. Em um tweet, o político palestino veterano Hanan Ashrawi comentou amargamente: "Que você nunca seja vendido por seus 'amigos'."


O emirado do Golfo não abandonou totalmente os palestinos, disse-me Daniel Kurtzer, o ex-embaixador dos EUA em Israel e no Egito. Em vez disso, "perdeu a esperança de que a liderança palestina pudesse ser salva". Os dois territórios palestinos - Cisjordânia e Gaza - são governados por facções rivais desde 2007, quando suas milícias lutaram pelo controle. O Hamas, um partido islâmico, tomou o poder em Gaza, enquanto o Fatah da O.L.P. regido pelo presidente Mahmoud Abbas governa a Cisjordânia. As repetidas tentativas de reconciliá-los falharam, tornando as negociações para uma paz viável ou duradoura com Israel quase impossíveis. Abbas, que tem oitenta e quatro anos, foi eleito para um mandato de quatro anos em 2005, e novas eleições foram adiadas várias vezes desde então. “A liderança agora é esclerótica e desprovida de diplomacia ou política criativa”, disse Kurtzer. “Se eu fosse palestino, ficaria extraordinariamente frustrado com minha liderança. Eles fizeram um péssimo trabalho de traduzir a vitimização em uma política positiva.” Os palestinos precisam resolver sua própria bagunça política antes que o mundo árabe volte a investir muita influência política para ajudar sua causa.


Ao contrário dos acordos de Israel com o Egito e a Jordânia, seu acordo com os Emirados Árabes altera uma premissa fundamental de paz, observou Sachs. Por décadas, a estrutura da diplomacia internacional foi baseada em “terra pela paz” - Israel desistindo de terras que conquistou em guerras com os árabes em troca dos árabes prometendo nenhuma agressão futura. A nova premissa é “paz por paz”, um refrão popular entre os israelenses de direita, disse Sachs. Baseia-se na não troca de terras - e apenas na suspensão temporária de uma promessa de proclamar a soberania sobre mais terras árabes, em troca de um pacto de não-agressão e relações formais. A questão que surge é como a aliança formal entre Israel e uma pequena mas influente nação no Golfo afetará as crescentes tensões com o Irã. “Se você está procurando uma ideia estruturante que mudou tanto quanto mudou no Oriente Médio nos últimos seis ou sete anos, o Irã é o lugar por onde começar”, disse Kurtzer. “Isso é o que trouxe os Estados do Golfo e Israel ao mesmo lugar.” Israel agora tem um aliado na linha de frente com a República Islâmica - que fica a apenas cinquenta e três quilômetros de distância dos Emirados Árabes Unidos.

 

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